"Graças a Deus" cutuca a ferida aberta da Igreja Católica ao revisitar denúncias de pedofilia


O diretor francês François Ozon (O amante duplo, Jovem e Bela), lança amanhã (20) nos cinemas seu mais recente filme "Graças a Deus"(2018). Ganhador do Grande Prêmio do Júri na última edição do Festival de Berlim, a narrativa cutuca a ferida aberta da Igreja Católica ao revisitar denúncias de pedofilia envolvendo a instituição.

Baseado na história real de Alexandre Guérin (Melvin Poupaud), François Debord (Denis Menochet) e Emmanuel Thomassin (Swann Arlaud), o filme reverbera o ato de coragem desses três homens ao confrontar a omissão da Igreja Católica quando foram vítimas do padre Bernard Preynat, da arquidiocese de Lyon, na França. Os três relatam os abusos sofridos no período de 1986 a 1991, quando ainda era menores de idade, só em 2015. Após a queixa dos três, foi criado a associação La Parole Liberée, onde mais de 70 pessoas também manifestaram abusos semelhantes sofridos pelo mesmo padre.

A ideia inicial do diretor era fazer um documentário, porém ao dialogar com as vítimas sentiu a necessidade de optar pela ficção: "quando comecei a discutir o projeto em termos concretos com as vítimas, senti que estavam decepcionadas e reticentes sobre a ideia do documentário. Ficaram intrigados quando um cineasta de ficção se aproximou deles. Então eu pensei: é isso que eles querem de mim, e é isso que eu sei fazer”

Dessa forma, o cineasta parte do ponto de vista de Alexandre, François e Emmanuel para construir a narrativa na órbita de sensibilizar e aprofundar na vida pessoal deles. Esse rigor técnico em mostrar a versão de cada um sobre os fatos e o quanto os abusos sofridos traumatizaram suas vidas, amplifica a realidade sórdida por trás de uma instituição que supostamente deveria prezar pela proteção de seus súbitos. 

A expressão 'graças a Deus', comumente utilizada para indicar felicidade, no caso do filme é dita pelo cardeal francês Phillipe Barbian, quando expressa aos jornalistas sua sensação ao saber que certas acusações feitas ao padre Bernard Preynat tiveram os prazos caducados. Ele diz: "Graças a Deus a prescrição venceu", frase um tanto quanto perversa. 

Mesmo com esse cenário trágico e de sordidez moral, presencia-se a tessitura dos rituais e ensinamentos católicos, seja pela ida à missa ou celebração de crisma, Natal ou Páscoa vivenciados pelos personagens, quanto na busca pelo perdão do padre acusado. Sem sombra de dúvidas, "Graças a Deus" provoca uma reflexão sobre o âmago pecaminoso da Igreja Católica, e um fomento para que ações concretas sejam tomadas para não permitirem a pedofilia dentro da instituição.
CineBliss *****



Ficha técnica:

Graças a Deus (Gracê à Dieu)
Bélgica, 2018
Direção: François Ozon
Roteiro: François Ozon
Produção: Eric Altmayer, Nicolas Altmayer
Fotografia: Manuel Dacosse
Montagem: Laure Gardette
Elenco: Melvin Poupaud, Denis Menochet, Swann Arlaud

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