"O ano de 1985" embriaga as telas com uma história imersiva e humana


O início da década de 1980 é marcado pelos primeiros registros de casos de AIDS em metrópoles norte-americanas como Nova Iorque, São Francisco e Los Angeles. Logo, o número de pessoas infectadas pelo vírus HIV alastra-se por outras partes do mundo, o que demanda dos órgãos de saúde uma ação imediata para conter a doença. Todavia, só a partir de *1986 é que surgem os primeiros medicamentos, no caso o AZT ou azidotimidina, primeira droga antiviral aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA) para ajudar no combate a mortalidade geral dos infectados. Nesse estágio de descobrir as causas, de estudos, de medicamentos e prevenção, milhares de portadores do vírus HIV tiveram suas vidas interrompidas.

Partindo desse pressuposto, o longa-metragem que estreia hoje nos cinemas "O ano de 1985" (2018), inspirado no premiado curta-metragem "1985", de 2016, ambos dirigidos Yen Tan (Pit stop) retrata o doloroso e comovente processo de estar em contato com o vírus HIV nesse período repleto de incertezas, medos e sem nenhuma perspectiva de cura. No foco, está  o jovem Adrian (Cory Michael Smith), quando retorna para o Texas para celebrar o Natal com a família, após ficar três anos longe morando em Nova Iorque. Neste ambiente familiar, Adrian busca se reconectar com os entes queridos e amigos, ao mesmo tempo que tenta lidar com a dor do luto de ter perdido vários amigos para a AIDS e, em revelar seu maior e penoso segredo.

Esse tipo de jornada de aproximação e despedida ao lado da família por causa do vírus HIV já foi alvo de várias narrativas cinematográficas, como no caso do filme francês "É apenas o fim do mundo" (2016), do diretor Xavier Dolan. Nesse drama, o protagonista ao visitar à família depara-se com um ambiente absorto de mágoas, choros e discussões em voz alta. O que era para ser um instante precioso de adeus para o personagem torna-se um momento propício para os familiares vomitarem verborragicamente traumas do passado. 

Em "O ano de 1985", diferentemente a abordagem não busca lavar a roupa suja, já que também há assuntos mal resolvidos, mas em acolher e humanizar o caráter e as dores dos personagens. Isso se vale tanto para Adrian, quanto para a mãe e o pai - interpretado respectivamente pelos atores Virginia Madsen e Michael Chiklis. Os pais oriundos de uma sociedade conservadora, patriarcal e religiosa, buscam conectar-se com o filho, cada um do seu modo, proporcionando cenas de pura emoção e demonstrando performances que mesclam o afeto e o rigor técnico. Tal como na sequencia em que o pai diz à Adrian: "Você sempre pode contar comigo" ou a mãe para o mesmo: "Quando você estiver preparado para falar. Eu vou estar preparada para ouvir".

O modo como essas relações familiares fragmentadas são cuidadosamente trabalhadas ganha destaque no vínculo de cumplicidade entre Adrian e o irmão adolescente, Andrew (Aidan Langford). Vide as cenas em que os dois dialogam sobre gostos musicais. Se o primeiro buscou encontrar sua felicidade em outro lugar e caminha submerso em sofrimento pelos lutos de seus amigos titubeando na linha tênue entre a vida e a morte. O segundo por sua vez, encontra-se com um futuro inteiro à sua frente e inspirado pela coragem do irmão de ter saído de um local ao qual não pertencia. 

Mesmo com o tema do vírus HIV pairando toda a história, a doença em si não é citada e transforma-se em um despertar para outras questões tais como laços familiares, a sensação de não pertencimento, bullying, a homossexualidade, a virilidade masculina, certos preconceitos, a morte, entre outros. Esse conjunto de tópicos é trabalhado pelo roteiro de modo sensível, primoroso e imersivo. Não é à toa, a escolha da fotografia em preto e branco que torna o drama ainda mais verossímil, segundo o diretor.
CineBliss*****
 


Ficha técnica: 

O ano de 1985 (1985)
Estados Unidos, 2018
Direção: Yen Tan 
Roteiro: Hutch, Yen Tan 
Produção: Hutch, Ash Christian, 
Elenco: Cory Michael Smith, Virginia Madsen, Michael Chiklis, Jamie Chung, Aidan Langford
*Referencia tirada no artigo: http://www.boasaude.com.br/artigos-de-saude/3838/-1/historico-da-aids-uma-historia-de-lutas-decepcoes-guerra-de-vaidades-e-coragem.html

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